Turma do TRT-MG decide: condenação ao pagamento de horas “in itinere” persiste mesmo após Reforma Trabalhista.

A Justiça do Trabalho mineira condenou uma empresa do ramo de café a pagar horas in itinere a um ex-empregado que trabalhou para a empregadora entre fevereiro e abril de 2019. Acompanhando o voto do desembargador José Eduardo de Resende Chaves Júnior, os julgadores da Primeira Turma do TRT de Minas entenderam que a reforma trabalhista (Lei nº 13.467/17) não impede a condenação. A decisão considerou que o trabalhador ficava à disposição do empregador durante o deslocamento para a fazenda, que estava situada em local de difícil acesso e não servido por transporte público.

A discussão tem como pano de fundo o parágrafo 2º do artigo 58 da CLT, que passou a ter a seguinte redação com a Lei 13.467/17 (reforma trabalhista): “O tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador“.

A reclamada sustentou que a reforma trabalhista teria excluído o direito às horas in itinere. Mas o juízo da Vara do Trabalho de Araxá entendeu por bem condená-la ao pagamento de três horas diárias, com reflexos em outras parcelas. É que a prova testemunhal revelou que os empregados levavam 1h30min no trajeto da cidade para a fazenda. O representante da empresa disse que a distância percorrida era de 16 km de asfalto e mais de 42 km de terra.  Para o juiz sentenciante, o tempo gasto por trabalhador rural no deslocamento até o local de trabalho integra jornada de trabalho.

Ao confirmar a decisão de primeiro grau, negando provimento ao recurso empresário, o relator lembrou que a doutrina trabalhista constitui fonte de direito. Conforme explicou, a ampla maioria entende que, em se tratando de necessidade de transporte especial, em local de difícil acesso ou não servido por transporte público, é devido ainda o tempo à disposição do empregador, nos termos do artigo 4°da CLT.

Com relação à nova redação do parágrafo 2º do artigo 58 da CLT, chamou a atenção para a omissão do dispositivo quando se trata de tempo à disposição do empregador em trajeto por necessidade de serviço, em decorrência da inexistência de transporte público ou não servido por este. Ponderou que, apesar de a “mens legislatoris” (espírito da lei) não ter força vinculante, pareceres demonstraram que os relatores da reforma, tanto na Câmara como no Senado, buscaram valorizar o empregador que conceda espontaneamente transporte para seus empregados, de modo que ele não seja punido por isso, nem venha a suprimir tal concessão, prejudicando os empregados. Como enfatizou o desembargador, somente a situação de horas de trajeto oferecido pelo empregador por conveniência e escolha própria do trabalhador foi tratada pelos relatores da reforma. Caso diferente do processo analisado por ele.

O magistrado apontou que o artigo 4° da CLT teve seu âmbito de aplicação restringido pela reforma, como se vê do acrescentado parágrafo 2º. Mas, como ressaltado pelo ministro Maurício Godinho Delgado, essa restrição não contempla os casos de tempo à disposição. Vale lembrar que o artigo 4º considera “como tempo de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada”. O parágrafo 2º prevê que não será tempo à disposição do empregador, nem computado como período extraordinário, quando o empregado, por escolha própria, buscar proteção pessoal. Isso em caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas. Também não considera como tempo à disposição do empregador quando adentrar ou permanecer nas dependências da empresa para exercer atividades particulares. Entre elas, práticas religiosas, descanso, lazer, estudo, alimentação, atividades de relacionamento social, higiene pessoal e troca de roupa ou de uniforme, quando não houver obrigatoriedade de realizar a troca na empresa.

Na avaliação do relator, a locução “escolha própria” inserida na cláusula exceptiva (parágrafo 2º do artigo 4°) à norma geral de tempo à disposição (caput do artigo 4°) reforça o entendimento no sentido de que a dogmática trabalhista passa a distinguir entre tempo à disposição por necessidade da atividade empresarial e tempo à disposição por conveniência pessoal do empregado. Conforme registrou, o advérbio “inclusive”, constante da nova redação do parágrafo 2º do artigo 58 da CLT, restringe o âmbito da extensão interpretativa da norma geral que exclui o tempo de trajeto do âmbito de aplicação do caput artigo 4° da CLT, vale dizer que restringe a interpretação ao limite semântico da inclusão (inclusive o transporte fornecido pelo empregador), abrindo espaço de interpretação para outras hipóteses não tratadas no artigo.

Em outras palavras: “A omissão quanto à hipótese de transporte por necessidade da atividade da empresa, quando ela exercer tal atividade em local de difícil acesso e não servido por transporte público, não pode ser considerada nem mesmo silêncio eloquente da norma, haja vista a própria literalidade da restrição do dispositivo de extensão do conteúdo da inclusão (transporte fornecido pela empresa tout court)”.

O desembargador José Eduardo explicou que a norma culta condena o uso desse advérbio com sentido de mera ênfase do advérbio “até” ou da locução adverbial “até mesmo”. O advérbio “inclusive” tem significado semântico de adição, de inclusão, não de mera ênfase. O artigo 58, parágrafo 2º, prevê que o tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador.

No seu modo de entender, a prevalecer a interpretação em relação aos novos contratos, será uma chamada veemente para a dispensa. “Um convite ao turn over em massa”, enfatizou. Portanto, o magistrado considera não haver nem literalidade a autorizar a transferência do ônus argumentativo para a interpretação supostamente não literal. Ao contrário, destaca que há, no mínimo, um amplo espaço interpretativo para a colmatação jurisprudencial (instituto que permite ao juiz a correção de falhas e imperfeições ou o preenchimento de lacunas da legislação).

Nesse caso, segundo observou, a opção preferencial para a colmatação jurisprudencial deve atender não só aos princípios do Direito do Trabalho, como também à interpretação sistemática do parágrafo 2º do artigo 58. Não como norma isolada, mas como preceito que compõe um sistema normativo, sistema esse informado, sobretudo, pelo artigo 4° da CLT, norma fundamental na sistemática remuneratória do trabalhador. “Colmatação jurisprudencial que jamais poderá descolar dos preceitos constitucionais, até internacionais, que consagram a progressividade e o não retrocesso das normas sociais do trabalho”, destacou ao final, confirmando a decisão de primeiro grau que entendeu que o tempo gasto pelo autor no deslocamento até o local de trabalho na área rural integra sua jornada de trabalho.

(0010680-27.2019.5.03.0048)

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais, 09.12.2019

NEGADA A REINTEGRAÇÃO DE MECÂNICO COM DOENÇA PSIQUIÁTRICA NÃO RELACIONADA AO TRABALHO

Os transtornos surgiram após ele ser atropelado em dia de folga.

A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho considerou indevida a reintegração no emprego de um mecânico que prestava serviços para a Vale S. A. diagnosticado com transtorno psiquiátrico. Segundo a Turma, os elementos do caso não permitem concluir que ele estava incapacitado para o trabalho no momento da dispensa.

Atropelamento

O mecânico, que tinha de fazer uso de medicação contínua em razão da doença, ficou afastado por auxílio-doença depois de ter sido atropelado num dia de folga. Em razão do acidente, disse que desenvolveu problemas psiquiátricos que exigiam o uso contínuo de “medicação fortíssima”.

Embora tenha sido considerado apto ao serviço após a alta do INSS, o médico psiquiatra registrou a necessidade de manutenção de tratamento ambulatorial e de restrição para atividades em lugares altos e em espaços confinados. Uma semana depois do retorno, a empresa rescindiu unilateralmente o contrato de trabalho.

Na reclamação trabalhista, o mecânico sustentava que, apesar de não se tratar de acidente de trabalho, ele fora dispensado sem aptidão plena para o trabalho.

Inaptidão

O pedido de reintegração foi julgado improcedente pelo juízo da 9ª Vara do Trabalho de Vitória (ES). Porém, o Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região declarou nula a rescisão e considerou suspenso o contrato de trabalho, em razão da inaptidão do empregado.

Conclusão diversa

Embora tenha considerado como verdadeiros os fatos descritos pelo Tribunal Regional, a Quinta Turma do TST chegou a conclusão inteiramente diversa. Para o colegiado, o fim da incapacidade foi devidamente provado, pois vários pedidos de extensão do benefício previdenciário haviam sido negados ao empregado.

O relator do recurso de revista da Vale, ministro Breno Medeiros, observou também que a médica da empresa havia atestado a capacidade do mecânico para o trabalho, ainda que com restrições para algumas atividades. “Nesse contexto, os elementos fáticos descritos na decisão do TRT não viabilizam a conclusão de que o empregado estava incapacitado para o trabalho no momento da rescisão contratual, de modo a ensejar a nulidade do ato”, afirmou.

Ainda segundo o relator, as limitações parciais para o desempenho de algumas atividades sequer foram reconhecidas pelo INSS como incapacitantes e, portanto, não são suficientes para retirar do empregador o direito à rescisão contratual. O fato de a doença não ter qualquer nexo com o trabalho, a seu ver, afasta a ocorrência de dispensa discriminatória.

(GL/CF)

Processo: RR-77800-64.2012.5.17.0009

9ª TURMA DO TRT1 (RJ) REJEITA AÇÃO INDIVIDUAL AJUIZADA APÓS FIRMADO ACORDO JUDICIAL COM AVAL DO SINDICATO DOS TRABALHADORES

Um motorista que aderiu a acordo judicial resultante de uma ação coletiva do sindicato de trabalhadores e, um ano depois, ajuizou ação trabalhista individual, teve seu pedido negado na Justiça do Trabalho. A 9ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT/RJ) acompanhou a decisão de primeira instância que acolheu a coisa julgada pelas rés (a empresa de ônibus e um consórcio), extinguindo o feito com resolução de mérito. O colegiado seguiu, por unanimidade, o voto do desembargador relator Célio Juaçaba Cavalcante.

No caso em tela, a Empresa de Viação Algarve LTDA. encerrou suas atividades em 2016, sem quitar as verbas rescisórias devidas aos trabalhadores. Diante disso, o Sindicato Municipal dos Trabalhadores Empregados em Empresas de Transporte Urbano de Passageiros do Município do Rio de Janeiro ajuizou ação trabalhista para que fossem rescindidos os contratos, sendo homologado acordo na extinta Coordenadoria de Apoio à Efetividade Processual do TRT/RJ, a Caep. O motorista foi um dos que aderiu ao acordo.

Em 2017, o motorista ajuizou reclamação trabalhista alegando que, diante da sua penúria, assinou um termo de acordo cheio de vícios, na garagem da empresa onde trabalhava. O trabalhador ressaltou que a empregadora não foi clara sobre os termos do acordo firmado na ação coletiva. Postulou, assim, a rescisão da decisão que homologou o acordo na Caep, entre outros pedidos.

A juíza Juliana Pinheiro de Toledo Piza, em exercício na 50ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, observou que havia uma cláusula expressa que não obrigava o trabalhador a aderir ao acordo firmado no âmbito da ação coletiva, podendo buscar outros meios – tais como uma ação individual. Dessa forma, extinguiu o feito com resolução de mérito e acolheu a coisa julgada.

O trabalhador recorreu da decisão, mas não foi bem-sucedido. O desembargador e relator Célio Juaçaba concluiu que “tendo o autor aderido ao acordo judicial por meio do termo de acordo no qual recebeu assistência sindical e conferido quitação geral quanto ao extinto contrato de trabalho, não pode propor ação individual pretendendo o pagamento de verbas que ainda entende devidas”.

Nas decisões proferidas pela Justiça do Trabalho, são admissíveis os recursos enumerados no art. 893 da CLT.

PROCESSO nº 0100630-66.2017.5.01.0050 (ROT)